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Espiritualidade ativa pode melhorar a saúde física, indica pesquisa internacional

Estudo mostra que práticas religiosas favorecem a saúde, especialmente entre idosos, e apontam relação entre fé, bem-estar e enfrentamento de doenças

12/05/2025 13h00
Por: Lara Duarte
Foto: Anna Cecília Rodrigues
Foto: Anna Cecília Rodrigues

Cultivar a espiritualidade pode trazer impactos diretos e duradouros à saúde do corpo. Um estudo recente, publicado na revista científica Plos One, identificou que o envolvimento em práticas religiosas e espirituais está associado a melhores condições físicas ao longo do tempo, especialmente na terceira idade.

A pesquisa foi realizada com mais de 3 mil americanos, avaliados inicialmente e, em parte, reavaliados seis anos depois. O objetivo foi entender se a religiosidade pode influenciar positivamente a saúde física. Os participantes responderam questões sobre frequência de orações, participação em atividades religiosas, nível de fé e maneiras de enfrentar dificuldades. A partir dessas informações, os cientistas classificaram o grau de engajamento espiritual de cada um.

Com base em modelagens estatísticas que também consideraram fatores como idade, gênero, escolaridade, renda e etnia, o estudo revelou uma relação significativa: pessoas com maior envolvimento espiritual na primeira etapa da pesquisa apresentaram melhor estado de saúde física na segunda avaliação. Essa ligação foi mais evidente entre os idosos.

Um ponto importante foi o sentido da relação observada. Enquanto a espiritualidade demonstrou ser um possível fator que precede uma boa condição de saúde, o contrário não foi verificado: estar fisicamente bem não indicou maior chance de a pessoa se tornar mais religiosa com o passar dos anos.

A Organização Mundial da Saúde (OMS) já reconhece a espiritualidade como um dos pilares da saúde integral. Para o geriatra Hugo Moura, do Hospital das Clínicas da Universidade Federal de Pernambuco (HC-UFPE), esse reconhecimento é essencial, pois fatores emocionais e sociais interferem diretamente na resposta dos pacientes aos tratamentos. Ele ressalta que isso é ainda mais evidente em situações de maior fragilidade, como nos cuidados paliativos.

Segundo Moura, é preciso olhar para além da doença e compreender a pessoa como um todo. Nesse contexto, a fé pode ser uma aliada poderosa, contribuindo não apenas para o alívio da dor física, mas também para o bem-estar mental, emocional e social. "A espiritualidade pode fortalecer a adesão ao tratamento e ampliar a capacidade de enfrentar o sofrimento", destaca.

A influência da espiritualidade vai além do aspecto individual. Comunidades religiosas atuam como redes de apoio que oferecem acolhimento e suporte em momentos difíceis. Isso é especialmente importante para pessoas idosas, que muitas vezes enfrentam perdas, limitações funcionais e isolamento.

Outros estudos também reforçam esse vínculo entre espiritualidade e saúde. Na Romênia, por exemplo, uma pesquisa com 112 pacientes internados por Covid-19 mostrou que os mais religiosos apresentaram uma taxa de mortalidade significativamente menor (1%) do que os menos espiritualizados (14%), mesmo com níveis semelhantes de comorbidades e comprometimento pulmonar.

O entendimento sobre os efeitos da espiritualidade no corpo humano ainda está em desenvolvimento. Os próprios autores do estudo americano destacam a necessidade de investigações futuras com análises mais amplas e uso de mediadores biológicos, como marcadores inflamatórios, para compreender melhor os mecanismos envolvidos.

Grandes entidades médicas já reconhecem o papel da espiritualidade na saúde. A Sociedade Americana de Geriatria, a Sociedade Europeia de Cuidados Paliativos e a Sociedade Brasileira de Cardiologia, por exemplo, recomendam que profissionais da saúde integrem essa dimensão ao atendimento clínico.

No entanto, especialistas alertam para o equilíbrio. Moura lembra que a fé não deve substituir o tratamento médico. “Não se trata de excluir a ciência, mas de unir forças. Acreditar em milagres é válido, mas também devemos enxergar o milagre que acontece todos os dias na dedicação à terapia”, afirma.

Outro aspecto importante é como a fé é utilizada para lidar com a doença. O professor Frederico Leão, da Universidade de São Paulo (USP), explica o conceito de coping, ou enfrentamento religioso. Segundo ele, quando a fé é usada de forma positiva, como fonte de esperança e força, tende a melhorar os resultados de saúde. Por outro lado, quando se transforma em sentimento de castigo ou abandono divino, pode piorar o quadro emocional do paciente — é o chamado coping negativo.

Uma pesquisa realizada na Bahia com 100 pacientes em hemodiálise mostrou que, no geral, prevaleceu o enfrentamento religioso positivo, sobretudo entre os adeptos do candomblé. No entanto, o coping negativo foi mais comum entre os pacientes evangélicos. Para os pesquisadores, entender essas estratégias é fundamental para que os profissionais ofereçam um suporte mais adequado e acolhedor.

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