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Saúde mental no trabalho vira obrigação legal e redefine cultura corporativa

Nova NR-1 e lei do certificado de bem-estar impõem às empresas a prevenção de riscos psicossociais

13/04/2025 20h00
Por: Janayna Carvalho
Foto: Reprodução
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A partir de maio de 2025, a saúde mental no ambiente de trabalho passará a integrar oficialmente as obrigações legais das empresas brasileiras. Com a atualização da Norma Regulamentadora nº 1 (NR-1), promovida pelo Ministério do Trabalho e Emprego, riscos psicossociais como estresse, assédio e sobrecarga emocional entram no rol de fatores ocupacionais que exigem prevenção, controle e gestão por parte das organizações. A nova diretriz representa um marco regulatório com potencial para transformar a cultura corporativa no país, forçando lideranças e departamentos de Recursos Humanos a adotarem medidas mais assertivas em relação ao bem-estar emocional de seus colaboradores.

A movimentação regulatória é acompanhada da entrada em vigor da Lei 14.831, que institui o Certificado Empresa Promotora da Saúde Mental. O selo, válido por dois anos, será concedido às companhias que implementarem políticas efetivas de promoção da saúde mental, incentivo ao bem-estar e transparência nas ações voltadas à qualidade de vida no trabalho. Para obtê-lo, as empresas precisarão apresentar um plano estruturado com ações que vão desde programas de apoio psicológico até campanhas de conscientização e estratégias contra o assédio moral.

A medida chega em um momento delicado. Dados do Instituto Ipsos apontam o Brasil como o quarto país mais estressado do mundo, e o Ministério da Previdência Social registra um crescimento superior a 400% nos afastamentos por transtornos mentais nos últimos anos. Somente no primeiro semestre de 2024, o Sistema Único de Saúde contabilizou quase 14 milhões de atendimentos psicológicos, evidenciando um cenário de exaustão emocional que atravessa todos os setores produtivos.

Maria Eduarda, que atua há 10 anos no setor industrial de Anápolis, avalia que a nova norma traz um reconhecimento necessário às dificuldades vividas por trabalhadores em diferentes segmentos. “A gente sempre fala sobre a importância da segurança física, dos EPIs, das máquinas, mas quase nunca sobre a pressão que a gente sofre no dia a dia. Tem semana que parece que o corpo tá funcionando, mas a cabeça já desligou. Essa norma chega tarde, mas ainda em tempo de evitar muita coisa ruim”, comenta.

A exigência de um ambiente psicologicamente seguro impõe uma reconfiguração da postura das lideranças. Maria Eduarda relata que, por muito tempo, expressar qualquer sinal de esgotamento era visto como fraqueza. “Já ouvi gestor dizendo que problema pessoal fica do lado de fora da fábrica. Mas como é que você deixa o que sente na porta de entrada? Somos humanos. E se a empresa quer produtividade, precisa cuidar da gente como um todo”, afirma.

Além de ser uma exigência legal, a adequação às novas normas representa também uma vantagem estratégica. Organizações que priorizarem o cuidado emocional podem observar não apenas a redução de custos com afastamentos, mas também um aumento real na produtividade e no engajamento das equipes. O bem-estar passou a ser um diferencial competitivo.

No entanto, especialistas alertam para lacunas na legislação, como a ausência de representantes dos trabalhadores nas discussões e o foco em medidas individuais sem o enfrentamento direto das causas estruturais do adoecimento psíquico. Para trabalhadores como Maria Eduarda, o sucesso da medida dependerá da disposição real das empresas em escutar quem está na linha de frente. “Não adianta só ter curso de meditação ou palestra motivacional. Se o ambiente continua tóxico, nada muda. O que a gente espera agora é ação de verdade, com diálogo e respeito”, conclui.

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