Nos últimos meses, uma tendência que parecia ter ficado no passado voltou com força total e conquistou um novo público: os livros de colorir. Antigamente vistos como entretenimento infantil, esses livros ressurgiram em versões adaptadas para jovens adultos, com ilustrações de bichinhos fofos, cenários aconchegantes e traços que estimulam o uso de canetinhas coloridas, promovendo uma experiência criativa, vibrante e relaxante.
Essa febre acompanha o crescimento de uma estética chamada “cozy” — termo em inglês que remete a algo confortável, acolhedor. A nova geração de coloristas busca mais do que uma distração: quer uma pausa das telas, um respiro da rotina e um momento só seu.
Igor Machado, jovem adulto anapolino, conheceu os livros de colorir da série Bobbie Goods por meio do irmão. “Ele me mostrou vídeos no TikTok, e a partir daí o algoritmo começou a gerar mais esse tipo de conteúdo para minha conta.” Desde então, os traços delicados e as combinações de cores dos vídeos começaram a chamar sua atenção. “As pinturas são bem legais e ficam bem harmônicas”.
Mesmo com a correria do dia a dia, ele consegue reservar um tempo para colorir. “Ao menos duas vezes por semana. Nos fins de semana, sempre busco colorir alguns desenhos.” Para Igor, o TikTok foi determinante: “O algoritmo contribui para isso. Uma vez que um vídeo é visto, você acaba vendo vários outros e, automaticamente, é influenciado”.
Colorir, segundo ele, é tanto relaxante quanto divertido. “É muito relaxante porque desliga da vida corrida, me permite ter um tempo sem o celular. E também é divertido por poder retornar à infância brincando com as cores”.
A plataforma, aliás, tem sido peça-chave para a popularização do hábito. Vídeos com técnicas de sombreamento, combinações de paletas e desafios criativos têm gerado milhões de visualizações. Um dos criadores de conteúdo mais influentes na área é Lucas Medeiros, que viralizou no TikTok com seus tutoriais detalhados e pinturas elaboradas em livros da série Bobbie Goods.
Outro anapolino fisgado pelo algoritmo é Luan Henrique. “Sim, foi pelo TikTok. O que mais me chamou atenção foi como as pessoas conseguiam fazer várias texturas com ‘facilidade’, e parecia tudo tão harmônico que dava vontade de fazer”, lembra. A inspiração veio com tanta força que hoje ele não vê a hora de chegar em casa para colorir. “Todo dia no serviço eu fico pensando: ‘chegar em casa vou pintar mais uma página e tentar fazer algo novo’. Tô gostando de ter esses pensamentos, creio sim que está fazendo parte da minha rotina".
Mesmo sentindo-se, às vezes, perdido com tantas possibilidades de cores, ele valoriza a experiência criativa. “Na hora de pintar eu não fico tão relaxado, pois são tantas cores que fico perdido em qual usar, mas depois que essa etapa passa, acho muito divertido pintar. Gosto de ver o desenho ganhando vida, até mesmo com os erros no caminho!”
Dos devocionais aos desenhos
Na virada de 2025, os livros de colorir começaram a ameaçar o reinado dos devocionais entre os mais vendidos no Brasil. O livro Café com Deus Pai, do pastor Junior Rostirola, que ocupava o topo da lista do PublishNews, foi destronado em fevereiro por dois volumes da série Bobbie Goods, lançada pela editora HarperCollins. Desde então, os bichinhos criados pela ilustradora americana Abbie Gouveia se mantêm no topo, ao lado de títulos semelhantes como Cozy Time e Comfy Days, ilustrados pela russa Aleksandra Bozhbova e publicados pela Ciranda Cultural.
A mudança de cenário mostra o apetite do público por produtos que ofereçam refúgio emocional e estímulo criativo ao mesmo tempo. “Estamos vendo o nascimento de um novo segmento de mercado, voltado ao conforto, à nostalgia e ao bem-estar”, avalia Ariane Munis, proprietária da Papelaria Criativa em Anápolis. Ela conta que percebeu um crescimento expressivo na procura por esses livros nos últimos meses. “Os títulos da Bobbie Goods são os mais desejados. Estou me organizando para começar a oferecê-los na loja, porque é uma demanda real e crescente por aqui".
Colorir faz bem
Além de divertido, o hábito de colorir é apontado por especialistas como uma prática terapêutica. Estimula a coordenação motora fina, ativa os dois hemisférios do cérebro, reduz os níveis de estresse e ansiedade, e proporciona um efeito semelhante ao da meditação.
Em um estudo publicado no Art Therapy: Journal of the American Art Therapy Association, participantes que coloriram apresentaram uma redução de 25% nos níveis de ansiedade. Além disso, cerca de 77% dos adultos relataram menor ansiedade após uma sessão de 20 minutos de colorir. O Cleveland Clinic Health Essentials confirma que o ato de escolher cores e se concentrar em manter-se dentro das linhas proporciona um efeito meditativo, trazendo uma sensação de calma profunda.
Esse efeito é reforçado pelo processo de escolha de cores, que ativa centros de recompensa no cérebro, ajudando na liberação de endorfinas — o que diminui os sintomas de ansiedade a curto e longo prazo.
Para muitos, o hobby vai além da estética ou da tendência. “É muito relaxante porque desliga da vida corrida, me permite ter um tempo sem o celular”, reforça Igor. E, para Luan, é também um reencontro com a infância: “A diversão está em poder brincar com as cores de novo”, finaliza.