O pacote fiscal do governo federal, destinado a conter despesas e melhorar a sustentabilidade da dívida pública, trouxe reações imediatas do mercado e levantou dúvidas sobre os impactos diretos na população. Em entrevista à Rádio Manchester/DM Anápolis, o economista Marcelo Moreira, professor e coordenador do núcleo de pesquisas econômicas da Universidade Estadual de Goiás (UEG), avaliou o cenário e os desafios que as propostas apresentam.
“O pacote vem com a proposta e o objetivo principal de reparação e contenção, e dar um contorno mais eficiente à sustentabilidade da dívida pública, a dívida/PIB. Tem crescido a expectativa de que ela aumente.
O governo Lula entrou com o pacote com a dívida/PIB na casa dos 68%, e ela pode chegar a 72% ou até 80%. É uma tentativa de reduzir o déficit primário, estabilizar o comportamento dessa relação e reduzir também a pressão do mercado financeiro sobre as contas públicas”, explicou. Desde o anúncio, o dólar atingiu recordes históricos, reflexo de um mercado em alerta. Para Moreira, a reação foi consequência de uma “tempestade perfeita”.
“O dólar, dependendo do grupo que faz a variação frente a outras moedas, teve o real como a sétima moeda mais desvalorizada até novembro. Depois do anúncio do pacote, o real passou a ser a segunda mais desvalorizada no período. Isso tem a ver com as expectativas sobre o pacote. Ele não veio completo, ao menos como o mercado esperava, e ainda houve o anúncio paralelo da mudança no imposto de renda, que acabou estabilizando um pouco a confiança, mas não evitou a turbulência”, explicou.
TAXAÇÃO
Uma novidade no pacote é a taxação de rendimentos elevados, medida que havia sido sinalizada na reforma tributária. Moreira destacou que essa proposta representa um avanço para a taxação de renda e patrimônio.
“O governo está cumprindo aquilo que já estava no texto da reforma tributária, na parte que trata do consumo. Agora apresenta medidas para a taxação sobre renda e patrimônio. Existe um teto constitucional, hoje fixado em R$ 44.008, e muitos rendimentos ultrapassam esse limite. O que o governo está propondo é ajustar esses casos para respeitar o que prevê a Constituição”, detalhou o economista.
Um dos efeitos diretos do pacote será a mudança na regra de reajuste do salário mínimo. Atualmente, o valor considera a inflação e o PIB de dois anos anteriores. Com a nova proposta, a variação ficará entre 0,6% e 2,5%, dependendo do desempenho fiscal do governo.
“Hoje, o salário mínimo varia pela inflação passada e pelo resultado do PIB dos últimos dois anos. Com a aprovação do pacote, além da inflação, ele seguirá o limite previsto no arcabouço fiscal. Isso significa que o salário mínimo já não aumentará como aumentaria no ano que vem. É uma diferença pequena, mas que, no contexto de variação, faz diferença para quem depende desse valor”, explicou o especialista. Além disso, a contenção das despesas obrigatórias pode liberar recursos para despesas discricionárias, como investimentos em infraestrutura.
Com a PEC enviada ao Congresso Nacional na última segunda-feira, 2, o governo tem até 20 de dezembro para buscar a aprovação das medidas antes do recesso parlamentar. Os presidentes da Câmara e do Senado se comprometeram a priorizar a análise do pacote, mas as resistências dentro e fora do parlamento prometem um processo de tramitação difícil.