No contexto do ‘Outubro Rosa’, o médico ginecologista e obstetra, professor doutor e supervisor científico do Conselho Científico da CHS Aprendizagem, Alexandre Vieira Santos Moraes, fala à Manchester FM/DM Anápolis sobre a prevenção dos cânceres ginecológicos, como o de mama, útero, ovário e endométrio. E explica que os recursos da medicina possibilitam boas chances de que mulheres afetadas pela doença possam projetar gravidez. Os tratamentos podem prejudicar a fertilidade da paciente mas, segundo Alexandre Vieira, hoje é possível falar da preservação da fertilidade, que seria guardar esses óvulos antes de fazer esse tratamento.
Como preservar a fertilidade durante o tratamento de câncer?
São pelo menos 73 mil casos no Brasil por ano. Este é o mês ‘Outubro Rosa’, é o mês do câncer de mama. E não só do câncer de mama, mas também na prevenção dos outros cânceres ginecológicos, como o câncer de útero, ovário e endométrio. Mas, especificamente, no câncer de mama, quando temos o diagnóstico, vai ter o seu tratamento, que envolve quimioterapia e radioterapia. E esses dois tratamentos podem prejudicar a fertilidade da paciente e também provocar a falência ovariana, quer dizer, diminuir os óvulos da paciente e prejudicá-la de ter a sua função ovariana depois do tratamento. Por isso que é importante a gente falar da preservação da fertilidade, que seria você guardar esses óvulos antes de fazer esse tratamento.
Qual o caminho que a ciência oferece à mulher que sonha em ter filhos, mas que vem enfrentando um câncer?
Após o diagnóstico do câncer, a paciente muitas vezes foca muito mais no câncer. E hoje temos tratamentos para câncer, que aumentam a sobrevida. A paciente com diagnóstico de câncer de mama, 90% delas, dependendo do tipo diagnóstico e o início do câncer, você tem uma sobrevida muito ampla, por mais de 5 anos, mais de 10 anos. A ciência hoje permite que essas pacientes possam guardar, congelar os óvulos, que se chama criopreservação. Ou congelar os embriões, se a paciente já tem um parceiro definido. Normalmente a gente faz essa criopreservação em duas semanas, no máximo quatro semanas já é possível guardar esses óvulos. A gente hoje tem protocolos que podemos iniciar a estimulação do ovário para captar esses óvulos em qualquer momento do ciclo menstrual da paciente. Então, a paciente, a partir do momento que teve o diagnóstico do câncer, se procurar um médico especialista em reprodução assistida, podemos iniciar a estimulação ovariana. Em 12 ou 15 dias já temos esses óvulos captados e congelados e a paciente fica livre.
Ou seja, é bem rápido então?
É bem rápido e encaixa também naquele período que ela está fazendo os exames, de pré-tratamento da quimioterapia e da radioterapia. Então, o que a gente tem aqui é a conscientização. Acho que o que a mensagem tem que passar é que existe essa tecnologia, existe médicos que possam estar fazendo esse tratamento, e conscientizar que a paciente tem essa oportunidade. Hoje alguns planos de saúde bancam esse tratamento porque essa falência do ovário faz parte de um efeito colateral do tratamento do câncer.
Esse processo de engravidar fica mais difícil para a mulher, dependendo do tipo de câncer que ela tiver?
Fica mais difícil. Depois do tratamento, você cai muito a condição do ovário, não só para a fertilidade, mas também essa paciente tem mais chances de entrar numa menopausa precoce. Mas vale lembrar, vamos dizer que a paciente não teve oportunidade de fazer a preservação da fertilidade. Fez o tratamento e quer saber se tem ainda condições de engravidar. É possível também parar o tratamento de hormônio e terapia por um ano, a dois anos. Assim, o tratamento tem rádio, quimioterapia e depois hormonioterapia, fica tomando medicações por 5 ou 10 anos. Então é possível parar por um a dois anos. Hoje tem trabalho para isso, fazer o tratamento ou tentar engravidar espontaneamente, e depois retornar para a hormonioterapia sem prejuízo na recidiva da doença.
Uma vez que a mulher teve câncer, se tratou, guardou os óvulos. Qual o período em que ele deve aguardar para buscar a gestação?
Um a dois anos. Aí ela já pode buscar esse projeto do tratamento.
É um projeto caro?
É. Envolve investimento no tratamento, nas medicações. Precisa de clínicas especializadas em reprodução assistida e equipes também direcionadas para esse tratamento.
Uma vez descongelados esses óvulos para o processo de fertilização, quais as chances que essa mulher tem?
A gente trabalha em reprodução assistida com probabilidades. O que eu posso dizer é o seguinte. Hoje a tecnologia está bem avançada. Quando você congela esses óvulos, temos uma recuperação, depois do congelamento do óvulo, de até 80%. O paciente recupera esses óvulos, aí eles são fertilizados com espermatozoide. A chance de gravidez vai ser definida pela idade da paciente e pelo momento que ela está passando.
É importante que a mulher, numa situação dessa, busque apoio de um profissional psicólogo, para conseguir lidar com esse cenário?
Na verdade, existe até trabalhos comprovando que quando a paciente guarda e preserva a fertilidade, significa que ela apostou no futuro. Já está se projetando para pós-tratamento de câncer. O apoio psicológico é importante e o fato dela ter feito essa prospecção de futuro, a faz encarar o tratamento do câncer de forma diferente. Ali não é apenas o diagnóstico do câncer que está tirando dela um momento da vida, mas também está mostrando que ela tem e pode ter vida. E todas as pacientes têm que entender isso, a paciente pode viver com muita boa condição depois dos tratamentos. Até porque no passado se imaginava que quando viesse um eventual diagnóstico de câncer, a vida já estava caminhando para o fim.
Hoje, a ciência médica já nos mostra que é diferente?
É evidente que tem alguns cânceres que têm situações diferentes. No câncer de mama, hoje temos uma sobrevida maior, principalmente pela detecção precoce. Então, é importante esses momentos de conscientização, do Outubro Rosa, para pensar, para mostrar para a população que a detecção precoce permite que você pegue o câncer numa situação de menor complicação.
O Outubro Rosa é fundamental para conscientizar as mulheres quanto à necessidade desse autoexame?
Sim, esse é o grande motivo. Outubro é apenas um mês que faz a lembrança da conscientização, do autoexame, do autocuidado em tudo, na atividade física, no controle dos hábitos não saudáveis, e lembrar da mamografia, da detecção precoce dos outros cânceres como preventivo. Lembrar que a paciente, na pós-menopausa, que tem um sangramento, tem que procurar um médico para fazer um exame de ultrassom. Então esse momento de outubro é um momento para se lembrar disso, mas vamos também deixar pontuado aqui que é só o mês de conscientização. A mulher tem que se cuidar em todos os meses. Procurar o ginecologista todos os meses e ter o autocuidado todos os dias.