Saúde BELEZA A TODO CUSTO

Dermatologista inicia pesquisa com vítimas por uso de PMMA

Preenchedor utilizado nos glúteos e que virou moda em clínicas de estética tem provocado mortes e outros problemas

15/07/2024 09h53
Por: Marcos Vieira
Foto: Reprodução/Freepik
Foto: Reprodução/Freepik

A médica dermatologista Mayra Ianhez, professora da Universidade Federal de Goiás (UFG), lidera uma pesquisa com pacientes vítimas do uso do polimetilmetacrilato (PMMA). A substância, que é um plástico, no passado era usada para próteses e órteses, mas passou a ser utilizada hoje em dia em grande quantidade como preenchedor, sobretudo nos glúteos.   

“Seu uso tinha diminuído porque como ele é definitivo, as complicações são definitivas, mas recentemente houve um boom, um crescimento muito grande de novas aplicações, principalmente com a fala de indústrias farmacêuticas e alguns médicos dizendo que agora o PMMA veio diferente, como um bioestimulador de colágeno, quarta geração, inerte, e a gente sabe que isso não acontece e a gente está vendo isso no meu estudo”, explicou a médica Mayra em entrevista à Rádio Manchester, na última sexta-feira, 12.

No dia 2 de julho, a influenciadora digital Aline Maria Ferreira, de 33 anos, morreu após realizar um procedimento estético nos glúteos em uma clínica em Goiânia. Ela fez aplicações de PMMA. Mayra Ianhez disse que há outras substâncias sendo aplicadas em clínicas além do PMMA, como o silicone industrial, que também causa diversos malefícios. A médica explicou que no caso do polimetilmetacrilato, a Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária), libera o preenchedor em algumas situações. 

“Ele é liberado única e exclusivamente para lipodistrofia do HIV e para pacientes com teoricamente imperfeições e que precisam fazer algum tipo de volumização. Só que nesse esclarecimento da Anvisa, ela já fala que a volumização glútea e que altas quantidades não seriam o ideal. Então essa é a grande questão. E além disso, junta isso, as pessoas procurarem não-médicos, ou seja, pessoas que não são médicas para fazer o procedimento”, informou Mayra. 

Outro agravante é que tem médicos aplicando o PMMA e que não possuem título de especialista para atuar nessa área. “E do ponto de vista médico, se a gente quiser pensar se existe outra opção para injetar, por exemplo, no glúteo sem ser PMMA, eu digo que sim. Existe o ácido hialurônico. Lógico, ele não dura tanto quanto o PMMA, que é definitivo. Mas existe essa opção, existe prótese de silicone, existe lipoescultura, que é você retirar a gordura de alguma área e colocar no glúteo”, disse a médica.

Até mesmo para a lipodistrofia do HIV, que é o emagrecimento da face e outras partes do corpo, é possível utilizar o ácido hialurônico. Hoje em dia esse tratamento é feito com pacientes mais antigos, pois os novos medicamentos não causam mais esse problema. “Então, a gente vê que do ponto de vista ético, não existe tanta necessidade de se utilizar o PMMA, principalmente como volumizador glúteo, até porque a Anvisa esclareceu que para esse uso, teoricamente, não seria o adequado. E além disso, junta ao fato os profissionais que não são adequadamente treinados, que não têm especialização e que nem são médicos”, completou a médica.

 

QUESTIONÁRIO

Para saber mais sobre esse assunto, entender melhor o tempo decorrido entre a aplicação do PMMA e a complicação, qual o produto injetado, quais as áreas afetadas, os fatores de risco para complicações, como se deu o atendimento desta complicação e qual foi o resultado desse tratamento, Mayra Ianhez está realizando uma pesquisa com pacientes vítimas do uso do produto.

“Não adianta as pessoas ficarem brigando no Instagram, nas redes sociais, processando esses médicos, esses não-médicos. Isso não vai levar a nada. O que a gente tem que fazer realmente é um levantamento, até para a gente descobrir se isso é verdade, se é o PMMA, se é outra substância, quais são os fatores de risco pra esses pacientes evoluírem de forma ruim, principalmente com a morte”, explicou a médica. 

Um questionário está à disposição na bio do perfil no Instagram da médica (@dramayraianhez) e também em @vitimasdabioplastia. “A primeira coisa é saber que esse questionário é só para quem tem complicação de PMMA. Silicone, óleo de silicone, nada disso entra na nossa pesquisa. Eu sei que existem vítimas que usaram outros tipos de tratamento, outros preenchedores definitivos, mas é muito importante que vocês participem para gente entender melhor o que está acontecendo com esses pacientes de PMMA”, orientou Mayra.

O uso indiscriminado do PMMA em procedimentos para preenchimentos em grandes áreas do corpo tem causado complicações imediatas e tardias, como nódulos, irregularidades irreversíveis na pele, necroses, inflamações e infecções na área aplicada, mas novos problemas têm surgido, como a insuficiência renal, o que já levou a Sociedade Brasileira de Nefrologia a fazer um estudo sobre essa associação.

Mayra contou que há dois anos atrás tomou conhecimento que existia insuficiência renal por PMMA, mas apenas casos isolados e relatados em publicações especializadas na área da nefrologia. “Esse crescimento importante de pacientes com insuficiência renal, hipercalcemia e cálculos renais, aconteceu a partir do boom de aplicação de PMMA, principalmente nos glúteos”. 

“E com essa nova proposta de dizer que esse PMMA era seguro, que era a quarta geração, o paciente pode ter complicações imediatas a hora que ele aplica, que pode ser embolia pulmonar, porque é aplicado intramuscular muitas vezes. Além disso, a gente pode ter infecções ou também nódulos inflamatórios tardios”, completou a médica. 

 

HIPERCALCEMIA

Segundo ela, o paciente aplicou o PMMA, principalmente, no glúteo, ele começa a sentir dor, começa a sentir quente no lugar, começa a sentir vermelho, como se estivesse inflamado. Depois isso a pele começa a escurecer. O paciente pode ter uma hipercalcemia, que é o aumento do cálcio, pois o PMMA induz uma inflamação chamada de granulomatose. E esses granulomas produzem cálcio e o cálcio vai gerar insuficiência renal e, muitas vezes, até a morte.

“Estou atendendo uma paciente com insuficiência renal que aplicou 1 litro de PMMA. E foi desses novos que o povo diz que é seguro. Ela aplicou 1 litro e agora ela está com insuficiência renal. E como ela malhava, fazia muita academia, ela tomava creatina e ela achava que a creatina que estava dando a creatinina alta. Só que, na verdade, já era o PMMA”, revelou Mayra.

A médica dermatologista disse que quando se vai fazer um procedimento médico, é preciso ter certeza da substância que está injetando no corpo. Em segundo lugar, aplicação de PMMA deve ser feito com o médico especialista, um dermatologista ou um cirurgião plástico. Mas Mayra Ianhez frisou que não existe justificativa hoje em dia para se usar essa substância, além de casos de lipodistrofia do HIV ou em pacientes com imperfeições, como por exemplo, o paciente que teve uma deformidade, uma poliomielite, alguma coisa assim.

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