O juiz Gleuton Brito Freire determinou o pagamento de R$ 6 mil ao presidente da Câmara de Anápolis, Dominguinhos do Cedro (PDT), por ter sofrido danos em sua imagem a partir da publicação de uma notícia falsa a seu respeito.
O texto em questão afirmava que Dominguinhos havia rasgado uma emenda de um colega, no caso o vereador Lisieux José Borges (PSB), durante a realização de uma sessão extraordinária no Poder Legislativo.
O texto gerou comentários negativos contra Dominguinhos na internet. A defesa do presidente da Câmara, inclusive, alegou na ação movida na Justiça, que a notícia inverídica teria “afetado a sua honra, imagem e profissão, além de suscitar a fúria da população, estampada em comentários nas redes socias”.
O juiz explica na sentença que se extraiu da prova oral produzida na audiência de instrução, ao se ouvir testemunhas e um informante, todos servidores da Câmara, que negaram que o presidente Dominguinhos teria rasgado emenda apresentada por qualquer parlamentar naquela sessão extraordinária.
Além disso, completa o magistrado, foi apurado nas oitivas que o vereador proponente da emenda ao referido projeto de lei, o vereador Lisieux Borges, não compareceu à referida sessão, o que foi comprovado por documentação juntada ao processo.
“Desse modo, constato que os reclamados [repórteres] não lastrearam a conduta jornalística em cautela mínima que se faz necessária, vez que, em análise objetiva da prova produzida, nem ao menos buscaram se informar sobre a presença física de Lisieux Borges no parlamento municipal naquela data”, escreve Gleuton Brito.
Ao se defenderem no processo, os dois profissionais que assinaram a reportagem considerada inverídica pela Justiça, argumentaram que reportaram fatos que “efetivamente transcorreram na Casa Legislativa, afirmando que lhe foram relatados por fontes que acompanharam a sessão”.
“Além disso, [os repórteres] sustentaram que procederam na apuração e averiguação da informação, com a adoção da cautela necessária, agindo sob o pálio da liberdade de impressa”, escreve o magistrado.
Gleuton Brito aproveita a sentença para tratar do debate, considerado clássico no direito civil constitucional brasileiro, entre o livre exercício da liberdade de imprensa e os direitos da personalidade da pessoa envolvida em material jornalístico.
“A ordem jurídica pátria acolhe, de maneira prévia, o livre exercício da liberdade de imprensa, para impor aos responsáveis eventuais penalidades pelos excessos cometidos posteriormente. Dessa maneira, os direitos fundamentais que se digladiam – liberdade de impressa e honra e imagem das pessoas vinculadas às matérias jornalísticas – restam resguardados pela ordem jurídica”, diz o juiz.
Gleuton Brito completa: “Em busca de um parâmetro objetivo, apto a verificação de excessos cometidos por materiais jornalísticos, a doutrina aponta que a veracidade das informações prestadas ao público em geral é o limite intrínseco à liberdade de informação”.
O magistrado frisa que não se deve esquecer que a divulgação de informações, sobretudo as que se relacionam ao dinâmico mundo da política, há que ser célere e eficaz, mas isso não impede que a liberdade de imprensa seja reconhecida, mesmo quando a informação é desmentida, mas houve o propósito de narrar a verdade, quando o comunicador busca noticiar, diligentemente, os fatos ocorridos.
“Entretanto, no caso em vertente, constato que a matéria jornalística sob exame, de autoria inequívoca dos reclamados [repórteres], extrapolou o âmbito da liberdade de imprensa, mormente quando veiculou fato inverídico, objetivo e concreto, que teria ocorrido na sessão extraordinária da Câmara de Anápolis”, ensina o juiz.
O magistrado também escreve na sentença que a matéria jornalística, ao retratar a conduta descolada da ética parlamentar, que exige de seus integrantes uma postura de complacência com as opiniões contrárias e de procedimento sereno perante as controvérsias que são inerentes ao regime democrático, sobretudo do presidente da Casa, causou a este, “obviamente, indubitável prejuízo moral em frente a comunidade anapolina, conforme se extrai dos diversos comentários lançados na praça pública digital”.
“Fake news não é liberdade de expressão”
Na sentença, o juiz Gleuton Brito cita trecho do livro Curso de Direito Constitucional, de Gilmar Mendes e Paulo Gonet:
“(a) informação falsa, de modo geral, não se ampara na Constituição, porque conduziria a uma pseudo-operação da formação da opinião. Assinala-se a função social da liberdade de informação de “colocar a pessoa sintonizada com o mundo que a rodeia (…), para que possa desenvolver toda a potencialidade da sua personalidade e, assim, possa tomar as decisões que a comunidade exige de cada integrante”. Argumenta-se que, “para se exercitar o direito de crônica, que está intimamente conexo com o de receber informações, será mister que se atenda ao interesse da coletividade de ser informada, porque através dessas informações é que se forma a opinião pública, e será necessário que a narrativa retrate a verdade. Fake News não se enquadram no âmbito normativo da liberdade de expressão”.